domingo, 19 de setembro de 2010

A árdua trajetória de opinar

Expor-se em pontos de vista por meio de textos jornalísticos é enveredar por um mundo de palavras, de fatos, de pessoas e outros textos em busca de algo que sacie a própria fome de escrever e, ao mesmo tempo, estabeleça um elo com o leitor.
Creio que, vez ou outra, o risco da aridez de ideias há de bater às portas de cronistas, articulistas e escritores. Talvez em consequência de momentos de tédio com a realidade em suas múltiplas vertentes.
Nesse sentido, trata-se de um ato paradoxal. Ao mesmo tempo em que é frustrante o “espetáculo” do real, nele se deve penetrar cada vez mais em busca do alimento para o ato da escrita.
Em todo caso, nutro aversão a textos excessivamente melífluos, repletos de pensamentos ou conteúdos mais do que exaustivos. É difícil aturar o “bom mocismo” edificante.
Ronaldo Correia de Brito é médico e escritor. Embora nascido no sertão do Ceará, em 1950, reside há anos no Recife. Ficou mais conhecido por seus livros de contos chamados Faca e O Livro dos Homens. Recentemente, lançou seu primeiro romance, Alfaguara, que foi considerado pela crítica um dos melhores do ano passado.
Não li nenhuma de suas obras, mas já o conhecia justamente por seus artigos jornalísticos. Hoje, esse autor colabora com o portal Terra, na parte relativa ao Terra Magazine, onde escrevem vários jornalistas, escritores, cineastas e outros profissionais.
Foi um artigo de sua lavra no referido site que me trouxe à baila um tema polêmico e do qual parece que estamos sempre a fugir. Alguns, em virtude de suas ortodoxias, não admitem nem pensar sobre o assunto. O título do texto já é, em si, provocativo: “O dilema de não morrer”.
Nele, o médico e escritor relata a trajetória de um de seus pacientes que fora atingido por uma espécie de doença neurodegenerativa. Sem maiores detalhes, tal paciente veio a viver, com o passar dos anos, uma vida vegetativa. Hoje, ele não anda, não fala, é alimentado por sonda e passa 20 horas por dia numa espécie de respirador artificial. Não há perspectivas.
Ronaldo Correia aborda também a questão do atual prolongamento da existência humana, com o aumento da expectativa de vida em seus aspectos mais problemáticos. Assim se expressou: “A morte parece ter os dias contados e a vida não possuir limites. Compra-se o prolongamento da vida, mesmo que ela seja de qualidade duvidosa, como se compram produtos em prateleiras de supermercados. As UTIs estão repletas de doentes mantidos artificialmente, num desafio às leis naturais, que sempre regeram o tempo de nascer e morrer.”
Alega, por óbvio, que essa capacidade de prolongamento é muito maior para aqueles que detêm um certo poderio econômico. E prossegue indagando: “como deliberar sobre o prolongamento ou não de uma vida que já cortou seus elos com o mundo, mas que continua habitando entre nós?”
Como ele mesmo finaliza, algum dia, esse dilema pode ser de qualquer um de nós. A mim me fez pensar na legalização da eutanásia.
Alberto Calixto Mattar Filho

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